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Arte nativa: etnia Mehinako do Alto Xingu

Onde: Curitiba • 07 de Outubro - 2020 | Fotos Divulgação

Linha de produtos criados por Maria Fernanda Paes de Barros nasce a partir do encontro do passado e do futuro para construir um novo presente

É incrível como o olhar, após experiências imersivas em culturas ancestrais, começa a ter uma sensibilidade maior para enxergar novas formas de trazer nossa origem para a contemporaneidade. É por esse caminho que percorre Maria Fernanda Paes de Barros, artista, pesquisadora e idealizadora da Yankatu. Com a alma absorvida pelas vivências profundas pelos lugares que perpassa, Maria Fernanda, à sua maneira, leva consigo uma dose de cada aprendizado, trazendo à superfície revelações em forma de peças carregadas de valor, como um manifesto em prol da identidade brasileira. "A cada viagem que faço me torno mais humilde, percebo as diferenças por ângulos novos, reaprendo a olhar, entendo significados
através do lugar do outro", explica a artista.

Para a nova Coleção Xingu, o processo não poderia ser diferente. Porém, inusitadas circunstâncias marcaram o seu desenvolvimento. A coleção surgiu do encontro entre Maria Fernanda e a etnia Mehinako,
localizada na Aldeia Kaupu?na, no Alto Xingu, sul da Floresta Amazônica, no final do ano passado. "Xingu nasce a partir de um encontro entre passado e futuro, mas que se firma no presente, propondo novas maneiras de olharmos a tradic?a?o, com o respeito e admirac?a?o que ela merece, ao mesmo tempo em que usa da tecnologia para manter a comunicac?a?o em tempos de isolamento", conta Maria Fernanda, que, por conta das novas práticas desde o início da pandemia no mundo, não pôde retornar à aldeia Kaupu?na para continuar a produzir as peças.

Esse protocolo inédito na dinâmica fez Maria Fernanda encontrar novas formas de interação com os artesãos da aldeia. As aulas das técnicas de tecelagem que ela teria in loco se transformaram em vídeos gravados e enviados via internet; com a ajuda de Stive Mehinako, artista e um dos representantes da comunidade, Maria Fernanda conquistou uma nova cartela de cores, extraída das folhas e cascas de árvores nativas encontradas na reserva, com o objetivo de resgatar toda a potencialidade do Xingu. Com
Maibe Maroccolo, em Brasília, Maria Fernanda pôde contar para extrair essas tonalidades e fazer os pigmentos tintórios para colorir os fios de algodão, usados nas esteiras produzidas pelas mulheres da aldeia.

"Este projeto tem um gosto especial, pois a persistência e a criatividade uniram a Yankatu e a aldeia Kaupu?na no seu desenvolvimento, mesmo com os obstáculos impostos pela realidade. Os fios tingidos pela Mattricaria, com a mate?ria-prima colhida pelo Stive, chegaram aqui e la? e, mesmo distantes, eu e as mulheres Mehinako estamos juntas tecendo uma nova histo?ria: elas produzem a esteira com buriti na aldeia e eu. em São Paulo, aprendo com elas e tec?o, tambe?m, uma esteira com pequenos cilindros de cabreu?va macic?a", comenta Maria Fernanda.

Para desenvolver as peças da coleção, Maria Fernanda se inspirou nos objetos e elementos cotidianos do povo Mehinako e também de outras etnias. A mesa Alimento Para a Alma, teve como base as gamelas de cerâmicas utilizadas para o preparo de beijus, alimento tradicional feito com mandioca. A peça, produzida em Cabreúva parda, tem gravuras pintadas em urucum e carvão por Kulikyrda Mehinako, com detalhes de colares de miçangas vermelhas, feitos por Kayanaku Aweti. O banco Descanso para o Corpo, foi inspirado na construção das ocas, com suas amarrações de tiras de casca de árvores. A peça, também em Cabreúva parda, ganha uma curvatura nas pernas, fazendo uma referência direta às estruturas das ocas.

Toda esta troca, este aprendizado são de grande valia para Maria Fernanda, que sempre procura encontrar uma contrapartida para auxiliar a comunidade envolvida em seus projetos. Além de remunerar os artesãos de forma justa, a artista vai levantar fundos para aquisição de um barco a motor para ajudar a aldeia a se tornar autônoma na extração do buriti, utilizado tanto pelas mulheres em sua arte, quanto pelos homens na cobertura das ocas.

"Somar precisa ser feito com cuidado para que as identidades não se percam, nem se fundam. A soma não deve subtrair ninguém. Sei que parece estranho falar assim, mas se pararmos para pensar, quantas vezes, ao somarmos, enxergamos apenas o total e nos esquecemos das partes? Aqui entra a missão da Yankatu, apresentar a tradição através de um novo olhar, destacando o que temos de mais belo e genuíno com equilíbrio, respeito e admiração", finaliza.

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